Dica nº 55: Sistema de Treinamento.
Primeiramente, defina os objetivos do treinamento. Geralmente o treinamento para o ano seguinte começa um dia após a competição principal. Precisamos estabelecer metas, competições principais para as quais nos preparamos e organizamos toda a programação do treinamento em função destas. As demais competições serão consideradas secundárias, não interferindo no planejamento geral, tendo influência apenas no planejamento semanal específico de determinada fase.
Tenha um planejamento organizado: para a temporada, com a variação mensal, seguida da sequência semanal, com cada trabalho diário. E siga os princípios do treinamento esportivo.
Começamos com o princípio da adaptação, onde o treinador deverá adequar o trabalho físico de maneira que a carga esteja dentro de uma faixa que provoque o efeito de adaptação. Se o estímulo for de baixa intensidade, não haverá alteração fisiológica significante. Estímulos de média e alta intensidade exigem a adaptação do nosso organismo a um esforço acima do comum. Dentro deste princípio está colocado um intervalo de tempo necessário para se processar a restauração plena do glicogênio muscular após uma depleção intensa, ou seja, o tempo de recuperação após o esforço. Pode-se dizer então, que para haver um efeito de adaptação no organismo deve-se aplicar um estímulo de intensidade diferente entre os esforços, com um tempo de recuperação entre eles.
Após o treino, o corpo entra numa fase de regeneração até atingir de novo a homeostase e a duração dessa fase varia consoante a intensidade do treino. Quanto maior a qualidade da recuperação, conseguida pela boa alimentação e descanso, o nível de supercompensação vai sendo cada vez mais superior à linha do equilíbrio. Se for ativado um novo estímulo (ao iniciar um novo treino) quando estamos no topo da curvatura da supercompensação, conseguimos um crescimento muscular eficaz. Portanto, se não tivermos uma rotina alimentar adequada ou um bom descanso, a supercompensação não terá o efeito desejado. Este processo é chamado de síndrome da adaptação geral.
Outro ponto importante a ser observado na aplicação do princípio da sobrecarga é o momento ideal de aplicação da nova carga, ou da variação da carga durante a semana de treino. Tudo deve vir especificado no plano de treinamento e adaptado ao desenvolvimento individual. Foi verificado que a aplicação de cargas crescentes conduz a uma melhora na condição física do indivíduo. Assim, só poderão ser atingidos resultados elevados e mais duradouros se houver uma continuidade nesse trabalho. Essa continuidade é expressa no relacionamento entre uma sessão e outra (microciclo), entre a fase de preparação geral e a específica (mesociclo) e entre temporadas (macrociclo).
Geralmente no início de uma temporada planejamos uma fase básica com ênfase em seções de treinamento com maior volume e menor intensidade, o chamado treinamento aeróbico, onde o metabolismo aeróbio é utilizado durante toda a seção de treinamento contínuo, predominantemente. Também podem ser incluídos os chamados trabalhos de força, como os treinamentos em subida e treinamentos de saltos, entre os treinamentos intervalados. A relação volume e intensidade vai mudando na fase mais específica do treinamento, onde a intensidade vai aumentando progressivamente. No treinamento intervalado é enfatizado o treinamento anaeróbico, onde é exigido o uso do metabolismo anaeróbio de maneira controlada, variando as distâncias e intervalos de acordo com os objetivos a serem atingidos, e também para que as seções diárias não sejam muito monótonas.
Dentro dos microciclos é comum alternar entre seções contínuas e intervaladas. Como as seções intervaladas são mais exigentes e mais cansativas, no dia seguinte geralmente entra apenas corrida contínua, de baixa intensidade e maior volume, para permitir a recuperação muscular no intervalo mínimo de 48 horas entre uma seção intervalada e outra com grande intensidade. Para o treinamento de orientação, na fase específica e pré-competição procuramos dar prioridade ao treinamento em floresta, incluindo o treinamento intervalado na floresta.
Nos microciclos que antecedem competições importantes geralmente diminuímos o volume de treinamento, mantendo a intensidade aplicada na semana anterior. Apenas próximo à competição alvo é que reduzimos também a intensidade nos dias próximos, para termos uma recuperação adequada e estarmos prontos para um esforço máximo.
O princípio da continuidade também é fundamental. Nenhum ser humano é capaz de treinar continuamente por mais de algumas horas, por esta razão uma interrupção controlada no treinamento é benéfica e até necessária para o sucesso. Entretanto, considera-se que após 48 horas do último treinamento o organismo já sofre uma queda no seu condicionamento. Se o nosso objetivo for o desporto de alto nível esta queda poderá significar a derrota; um trabalho de alto nível considera no mínimo 5 sessões de treinamento semanal, para que a interrupção não afete o desenvolvimento do atleta.
As modificações fisiológicas do treinamento são específicas do grupo muscular, sistema energético e gestos desportivos treinados. Este é o princípio da especificidade. Até mesmo o treinamento chamado de cardiopulmonar, provoca melhoras especificamente para o grupos musculares que foram treinados. Assim, o treinamento de natação de longa distância pouco melhorará o rendimento na corrida longa. O treinamento de força irá afetar apenas os músculos envolvidos no exercício. As melhoras na flexibilidade ocorrem apenas nas articulações mobilizadas com frequência. O treinamento aeróbico provoca modificações na função cardíaca e no volume sanguíneo, mas como o desempenho físico depende também da musculatura estimulada. Com estas constatações verifica-se hoje uma adaptação dos diversos métodos de treinamento ao desporto considerado. A variação de treinamentos contínuos e intervalados também é aplicada de acordo com a especificidade do esporte, variando em local de aplicação e em intensidade de acordo com a competição alvo.
Este é só um resumo dos princípios aplicados. Devemos dispor do acompanhamento de profissionais do esporte para planejar e executar o treinamento corretamente, adaptando quando necessário, de acordo com nosso progresso. Além disso, o trabalho deve ser ajustado à nossa disponibilidade de tempo para treinamento e tempo para recuperação, dois fatores muito importantes para o sucesso do planejamento.
Cumpra sempre o treinamento planejado, ou pelo menos parte dele. O princípio da continuidade é tão importante quanto os demais para que tenhamos sucesso em nosso trabalho físico. Na sequência de treinamento visando bons resultados, não devemos ficar mais de três dias consecutivos sem treinar. Na execução, o aumento no valor do treinamento (duração, intensidade) numa seção diária nunca deve ser maior que 10% da média, mesmo quando estamos sentindo facilidade naquele treinamento. É comum nos empolgarmos, quando sentimos facilidade e fazermos esforço muito superior ao programado, daí podem ocorrer lesões por esforço demasiado forte. Mesmo não ocorrendo lesões, os treinamentos seguintes podem ser prejudicados, pois teremos maior dificuldade na recuperação.
Cabe lembrar que a seguir entra o princípio da recuperação – o descanso também faz parte do treinamento. Para que ocorra uma boa adaptação ao esforço é necessário que o intervalo entre as seções de treinamento seja adequado ao tempo de descanso e recuperação do organismo. Neste princípio está incluída a corrida de volta à calma, um bom alongamento após o treinamento, uma boa hidratação, o descanso extra, além do descanso noturno, e a dieta apropriada ao esforço desprendido, ou seja, uma dieta hipercalórica, mas balanceada em termos de qualidade proteica e com sais minerais.
Os atletas de tempo integral têm condições de executar treinamentos mais fortes justamente pelo fato de ter mais tempo disponível para a recuperação. Podem até fazer dois treinamentos num mesmo dia, sempre seguindo uma programação adequada para cada fase de treinamento.