Dica n° 97: Cuidado com os perigos naturais.
Num percurso de orientação encontramos vários obstáculos naturais. É necessário tomar muito cuidado com aqueles obstáculos que representam perigo ao orientista, como penhascos e barrancos altos, vegetação densa e com espinhos, charcos e rios intransponíveis. Na aviação, vários fatores adversos somados podem contribuir para um acidente aéreo ou até mesmo uma tragédia. Na orientação também precisamos estar atentos a certos cuidados para não sofrermos acidentes.
Eu presenciei uma ocasião onde os fatores adversos contribuíram para um acidente fatal com um colega durante um treinamento de orientação. Este aconteceu em 1996 com Ailton de Brito, sargento da FAB, durante um treinamento no Rio de Janeiro. Costumávamos treinar nas quintas-feiras, juntamente com outras equipes, cada vez com traçador de percurso diferente. Naquele dia Neir Braga foi o traçador e havia uma equipe do Exército participando. O Braga saiu para colocar os prismas e no sorteio da ordem de partida eu fui um dos primeiros e Brito o penúltimo. Completei o percurso sem problemas, chegando pouco depois do Braga ter acabado de colocar os prismas e depois que todos haviam partido e estavam no percurso. Depois que todos os colegas do Exército chegaram, sentimos a falta do Brito, e quando perguntamos se alguém o havia visto durante o percurso a resposta foi negativa. Passado o tempo normal de realização de percurso, dividimos o pessoal para voltar na área para tentar encontrá-lo. Procuramos até o final da tarde sem sucesso. Ao recolhermos a bolsa com o material do Brito encontramos a bússola entre seus pertences, fato que nos preocupou mais ainda, pois ele tinha saído sem a bússola. Ainda passamos de carro pelas principais vias da área após escurecer. A primeira pessoa que avisamos foi a esposa do Brito, deixando a bolsa dele com os documentos e pegamos uma foto para usarmos nas buscas seguintes. Voltamos para nossa organização e avisamos nosso comandante, que tomou as providências necessárias para que as buscas continuassem no dia seguinte. Voltamos na manhã seguinte com o auxílio de mais pessoas, inclusive pessoal especializado em busca e salvamento, separando várias equipes de busca para cobrir toda a área. Apenas no sábado de manhã uma das equipes conseguiu informações de pessoas que haviam visto o Brito na quinta-feira. Um coronel da reserva do Exército, que tinha uma chácara na parte leste da área tinha conversado com ele, cerca de meia hora depois do horário de partida. O percurso seguia para o norte e para oeste, mas Brito afastou-se para leste, cerca de 1 km fora da rota prevista, após o ponto 1, procurando o ponto 2. Passou naquela chácara procurando um local onde o caminho cruzava uma ponte. Ele pediu água e perguntou onde ficaria uma ponte nas proximidades, e o dono da chácara falou que no rio que passava ao lado tinha um tipo de ponte até o outro lado. O problema, além do Brito não estar com a bússola, foi não perceber que estava próximo do limite do mapa, onde tinha um rio de cerca de 50m de largura que corria de norte para sul e que não era o córrego de 10m de largura que corrida de oeste para leste, onde era a área do ponto de controle. A ponte próxima da chácara, na verdade era um aqueduto com uma diferença de altura maior que 3m de uma margem para a outra, com alguns ferros impedindo as pessoas da margem oposta passar no sentido contrário. Não dá para entender como ele não observou a largura do rio e não percebeu que nenhum traçador colocaria um ponto de controle naquele local. O pessoal da equipe de busca foi para o outro lado do rio e encontrou dois garotos que haviam visto o Brito. Eles estavam próximo ao rio, cuidando de um cavalo, quando viram o Brito passando para aquele lado e depois não conseguiu voltar pelo mesmo local. Viram que ele guardou um papel (o mapa) num bolso na frente da roupa e tentou atravessar de volta a nado, mas a correnteza era forte e o arrastou rio abaixo. O problema maior, além da correnteza forte, era que mais abaixo, depois da curva do rio, havia uma corredeira com muitas pedras. O corpo do Brito foi encontrado no domingo de manhã, num remanso cerca de 5 km abaixo, quando um helicóptero de busca vasculhava o rio. Uma série de fatores adversos contribuíram para este triste fim, mas a principal lição, fora a questão da busca por alternativas corretas de relocalização, é que não devemos subestimar os perigos da natureza, e jamais nos arriscarmos numa situação duvidosa de perigo em potencial.
Há perigos que estão além de nossa capacidade de superação. Geralmente os traçadores de percurso evitam os locais de risco, como aconteceu ali, mas cabe a cada orientista ter cautela e evitar colocar-se em situação perigosa. Em 2016 tivemos outro acidente fatal com o veterano Itamar Torrezam, que desviou um pouco da rota, e quando atravessava uma área de vegetação mais densa caiu de um penhasco com mais de vinte metros de altura.
Outro risco são as doenças transmitidas por carrapatos. O sueco Arto Rautiainen, depois que parou de competir na Elite, continuou envolvido com seu clube de orientação, até que morreu inesperadamente aos 36 anos de idade, durante um treinamento, sem motivo confirmado. Outras mortes misteriosas ocorreram com alguns orientistas da Europa, sem nenhuma causa ter sido encontrada, após efetuados os exames. Suspeita-se de encefalite transmitida por carrapatos, doença para a qual o governo sueco desenvolveu recentemente uma vacina que pode proteger. Às vezes as pessoas infectadas confundem os sintomas como a febre, com os de uma virose comum, mas o caso pode ser mais perigoso se não diagnosticado corretamente. No Brasil temos um risco semelhante de contrair a febre maculosa, doença semelhante à descrita acima, que já teve casos fatais entre pescadores, que contraíram a doença em locais onde havia capivaras.
E temos os riscos das doenças transmitidas por mosquitos, como a febre amarela. Os militares já costumam tomar as vacinas necessárias, e da mesma maneira os orientistas devem procurar as vacinas disponíveis para as doenças ligadas a áreas rurais e de floresta.
Casos fatais ocorrem em vários esportes, o nosso é um que teve poucos, mas vários acidentes menos graves podem ocorrer se não prestarmos atenção, assim devemos tomar os cuidados adequados em locais naturais que oferecem perigos potenciais.
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